RIO DE JANEIRO
História dos bondes em 75 Fotografias
da coleção de Allen Morrison
Esta é uma pesquisa ilustrada do desenvolvimento do serviço de bondes na cidade do
Rio de Janeiro (Brasil), mostrando imagens que não apareciam no meu livro The Tramways of Brazil
nem nas páginas sob o título Electric Transport in Latin America. Parte 3 (de 3): período de 1910 a 1967 A
Rio de Janeiro Tramway, Light & Power Company (RJTL&P) foi
fundada em Ottawa (Canadá) por um grupo de industriais
canadenses e norte-americanos, no dia 9 de julho de 1904. Cinco anos
antes, eles haviam fundado a São Paulo Tramway, Light &
Power. A RJTL&P construiu uma usina hidrelétrica no
Ribeirão das Lajes em 1906, e em 1907 comprou os sistemas de
bondes das companhias Vila Isabel, São Cristóvão e
Carris Urbanos, assim como a companhia telefônica e as
instalações de gás da cidade do Rio de Janeiro.
Mas ela não adquiriu os sistemas de bondes da Jardim
Botânico nem de Santa Teresa. Abaixo vê-se a entrada de um
dos imóveis da RJTL&P [coleção AM]: "A
Light" – nome pelo qual a RJTL&P era chamada pelos
brasileiros – encomendou um bonde elétrico de passageiros
da J. G. Brill, da Filadélfia, em 1905, mas depois disso
só importou dos EUA truques e motores. Dez bondes
elétricos de 10 bancos vieram da firma inglesa Brush Electrical,
em 1907, e 50 bondes similares vieram da United Electric, também
inglesa, em 1908. Em virtude da compra da companhia Vila Isabel, a
Light herdou as instalações daquela empresa, situadas no
fim da avenida Presidente Vargas, onde atualmente existe o conjunto
habitacional Martin Luther King Jr, próximo ao acesso ao elevado
Paulo de Frontin, nas imediações da Praça da
Bandeira. Ali, de 1908 a 1909, ela construiu 50 bondes de 10 bancos, e
no mesmo período comprou 13 bondes de dez bancos e 8 de treze
bancos – os primeiros bondes de 4 eixos a rodarem na cidade
– da Trajano de Medeiros & Cia. [coleção AM]: A Light construiu seu primeiro bonde de 13 bancos em 1909, e daí em diante fabricou seu próprio equipamento. Em 1º de janeiro de 1910 a Light possuía 213 carros-motores de passageiros, 210 reboques de passageiros e 70 bondes elétricos de carga, rodando em 221 km de trilhos, na Zona Norte e centro da cidade [vide mapa] . Em 1912 a quantidade de carros-motores de passageiros era de 340. Além das linhas de bonde, a Light também comprou a ferrovia a cremalheira do Corcovado, que sobe até a estátua do Cristo Redentor, e eletrificou seus 3,8 km de linha. As quatro novas locomotivas, construídas pela firma Schweizerische Lokomotiv- und Maschinenfabrik ("SLM"), da Suíça, usavam fornecimento de energia elétrica em 3 fases e tinham coletores de energia duplos, do tipo trolley (também chamados de lança), que eram abaixados durante o percurso de descida. A nova linha entrou em funcionamento no ano de 1910. A fotografia abaixo mostra a estação das Paineiras, no quilômetro 2,7 da ferrovia [coleção AM]: A
ferrovia do Corcovado adquiriu novo equipamento em 1977 e atualmente
é a única linha elétrica de passageiros a
cremalheira, no Hemisfério Ocidental. Eis um modelo de 13 bancos circulando no sistema Light [coleção AM]: A
Ferro-Carril do Jardim Botânico adquiriu bondes similares,
porém com as plataformas de ambas as extremidades fechadas.
É difícil afirmar se este modelo de 13 bancos foi
construído pela firma Trajano de Medeiros, pela Light ou
até mesmo pela própria Jardim Botânico
[coleção AM]: A ilustração abaixo era parte de um artigo publicado no jornal A Notícia,
em 12 de fevereiro de 1913. O artigo descreve completamente o bonde,
mas não diz quem o construiu. Observe a grafia da palavra
"bondes", na época [coleção AM]: Por
incrível que pareça, durante toda essa atividade de
eletrificação, uma companhia inglesa denominada The Rio de Janeiro
Suburban Tramways – RJST – inaugurou uma linha de bondes puxados a burro entre a estação
ferroviária de Madureira e Irajá, em 28 de setembro de 1911
[vide mapa]
.
Este cabeçalho em um certificado de ação mostra o
nome da companhia em inglês, em francês e em
alemão... mas não em português
[coleção AM]: Em
1928, a Light comprou a RJST e eletrificou a linha, reabrindo-a em 12
de outubro daquele ano, data em que foi tirada a foto abaixo. O bonde
é de segunda mão, originário da Ferro-Carril do
Jardim Botãnico [coleção AM]: Em
1911 a Light também comprou e eletrificou as duas linhas de
bondes puxados a burro da Companhia Ferro-Carril de Jacarepaguá,
que partiam da estação ferroviária de Cascadura
[vide mapa]
.
Observe as iniciais CFCJ sobre o portão da garagem dos bondes.
Esta fotografia foi tirada em 1965, pouco antes de a linha ser extinta
[Foster M. Palmer]: O
sistema de bondes com centro na estação
ferroviária de Campo Grande, 20 km a oeste de Cascadura, era um
dos favoritos dos fãs de bondes. Campo Grande é
fisicamente separado do resto da cidade por uma cadeia de montanhas,
mas como fazia parte do antigo Distrito Federal, é considerada
como pertencendo à cidade do Rio de Janeiro. A linha de bondes
puxados a burro inaugurada em 1894 foi eletrificada em 1917 e usava
bondes de segunda mão da Jardim Botânico, similares
àqueles vistos acima na linha de Irajá. As três
linhas elétricas de Campo Grande corriam em sua maioria no canto
das ruas. Uma viagem nos 20 km da linha Ilha levava 2 horas (não
há ilha em Campo Grande - o nome é uma corruptela de
William, um proprietário de terras da área)
[coleção AM]: Um tipo diferente de bonde recebe passageiros na estação ferroviária de Campo Grande, em setembro de 1963. A garagem dos bondes ficava no Monteiro [Earl Clark]: Crianças de todas as idades em um reboque [Foster M. Palmer]: A
última linha de bondes a ser aberta na cidade já nasceu
totalmente elétrica, sem antecedentes de bondes puxados a burro.
Era operado pela Companhia Melhoramentos da Ilha do Governador e
circulava somente dentro daquela ilha, situada na Baía da
Guanabara. Em 4 de outubro de 1922 foi aberta uma linha de 7 km de
extensão, ligando o terminal das barcas no bairro da Ribeira ao
bairro do Bananal [vide mapa].
O equipamento escolhido era de segunda mão, da Jardim
Botânico, similar ao usado nas linhas de Irajá e de Campo
Grande. O bonde mostrado na foto abaixo é uma versão
remodelada [coleção AM]: A
Light também remodelou alguns dos seus bondes. O local da foto
abaixo é a Praça Tiradentes – onde começou a
primeira linha de bondes do Rio, em 1859, e por onde passa atualmente
uma das linhas do VLT recém-entrado em operação [vide mapa]
[William Janssen]: Calças
compridas e largas eram a moda nos anos 1940, mas por que usar
paletó e gravata numa visita ao Jardim Botânico?
[coleção AM]: Os
passageiros nesse bonde não estão comemorando nada. O
veículo está se dirigindo para a esquerda da foto. Como o
motorneiro conseguia ver o caminho? Parece inclusive que ele baixou a
cortina do seu para-brisa! Como o condutor conseguia cobrar as
passagens? [coleção AM]: Praia Vermelha é o nome da praia e do bairro que ficam embaixo do Pão de Açúcar [Pan American World Airways, coleção AM]: Passageiros
de terno e gravata em um majestoso bonde nos anos 1940. O local
é a Praça Duque de Caxias, próximo à
estação ferroviária da Central do Brasil. Apenas
homens viajavam no estribo. As mulheres permaneciam dentro do bonde
[coleção AM]: Este
é o tranquilo terminal da linha Jardim Leblon, da companhia
Jardim Botânico. Inicialmente essa linha atendia basicamente aos
bairros do Jardim Botânico e Leblon, mas posteriormente foi
expandida e passou a terminar em Ipanema, próximo ao Jardim de
Alah [vide mapa]
. Num dos lados do bonde foi colocada uma tela de arame, por questão de segurança [coleção AM]: O
bonde número de ordem 2561 está fazendo a linha
Praça General Osório, que fica em Ipanema. Na foto, ele
está passando pela Glória e se dirigindo ao terminal do
Largo da Carioca
[vide mapa]
.
O Rio era a capital mundial dos bondes abertos, dos quais ela
possuía mais do que qualquer outra cidade do mundo. Cena como a
mostrada abaixo jamais existiu em outra cidade [Carl Frank,
coleção AM]: |
Esse
medicamento da Bayer garantia ajudar as pessoas a dormir caso elas se
incomodassem com o "barulho dos bondes passando na rua" De
1937 em diante todos os bondes da Jardim Botânico cujas linhas se
dirigissem a Botafogo, Copacabana, Ipanema, etc., passaram a fazer ponto
final num abrigo de um quarteirão de comprimento, chamado pelo
povo de Tabuleiro da Baiana, situado na avenida Almirante Barroso. A
foto mostra um bonde chegando pela rua 13 de Maio, à esquerda, e
um outro virando na rua Senador Dantas, à direita
[coleção João Diniz]: Os anos 1960 marcaram o início do fim dos bondes. No dia 31 de dezembro de 1960 a Companhia Ferro-Carril do Jardim Botânico, que deu origem à indústria de bondes no Brasil, deixou de existir. Seus bondes passaram a ser operados durante algum tempo por uma empresa municipal. Os motorneiros e condutores ainda usavam os antigos uniformes, mas os bondes e trilhos deixaram de sofrer manutenção [coleção AM]: Os
últimos bondes na Zona Sul – Copacabana, Ipanema, Leblon
– circularam em 21 de maio de 1963. A recém-criada
Companhia de Transportes Coletivos (CTC) encomendou 200 ônibus
elétricos da Itália e criou várias linhas desses
ônibus ligando o centro da cidade à Zona Sul. Em
1965 festejaram-se os 400 anos de fundação da cidade do
Rio e, entre outras comemorações, o governo deu
atenção às suas duas mais pitorescas linhas de
bonde. O sistema de Santa Teresa foi reformulado, e dez bondes de 13
bancos da antiga Light foram reformados, agora fechados em ambos os
lados, para a linha do Alto da Boa Vista
[vide mapa]
[Foster M. Palmer]: O
interior de cada bonde tinha assentos estofados, um mapa da linha acima
do motorneiro, e o slogan do aniversário de
fundação: "400 anos de Cidade Maravilhosa" [vide outras fotos da linha] [Foster M. Palmer]: O bonde 06 percorre o caminho sinuoso, montanha acima, através da luxuriante floresta do Parque Nacional da Tijuca [Foster M. Palmer]: Mas
os visitantes preferiam os famosos bondes abertos do Rio. E para
experimentar o novo serviço eles tinham de ir até a
Praça da Bandeira, onde a linha começava, e isto longe da
região turística que ela atravessava. Perda para o Brasil, ganho para os EUA. Um outro evento ocorrido em 1965 foi a venda de 12 bondes do Rio para museus norte-americanos: dois bondes de 2 eixos, números de ordem 322 e 441, e dez de 4 eixos, números 1718, 1719, 1758, 1774, 1779, 1794, 1850, 1875, 1887 e 1889. A maioria deles roda nos EUA atualmente. O 1779 aparece abaixo no Midwest Old Threshers Museum de Mt. Pleasant, Iowa, cerca de 300 km a oeste de Chicago [coleção AM]: Não
demorou muito para que os brasileiros se dessem conta do que haviam
perdido e passassem a ter saudade das boas tradições do
passado. O Rio sem os bondes era impensável, e tributos
começaram a aparecer, e ainda aparecem hoje em dia, em revistas
e jornais por toda a parte. A revista abaixo foi, muito
apropriadamente, publicada no bairro onde tudo havia começado,
121 anos antes, em 1859 [coleção AM]: Os bondes da antiga Ferro-Carril Carioca ainda correm sobre o aqueduto dos Arcos da Lapa, em direção a Santa Teresa [vide mapa]. A ferrovia a cremalheira ainda transporta passageiros do Cosme Velho até o Cristo Redentor, no topo do Corcovado. E o Rio inaugurou recentemente os primeiros trechos de seu novo VLT - Veículo Leve sobre Trilhos.
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The Tramways of Brazil e os dois artigos sobre a Ferro-Carril Carioca:
The Santa Teresa Tramway e Santa Teresa Tramway Vehicles
Outras fontes de informação:
Noronha Santos, Meios de Transporte no Rio de Janeiro, publicado no Rio em 1934: vol. 1 (de 2), pp. 235-240 e 255-475 C. J. Dunlop, Apontamentos para a História dos Bondes no Rio de Janeiro, publicado no Rio em 1953 C. J. Dunlop, Subsídios para a História do Rio de Janeiro, publicado no Rio em 1957; segunda edição, 2008 Marcus Vinicius Kelli Os Irmãos Röhe e o Mercado de Veículos na Cidade do Rio de Janeiro (1831-1883) Helio Ribeiro Bondes da Light do Rio de Janeiro Páginas extraordinárias sobre os bondes cariocas O Rio que o Rio não vê O bonde da Villa Guarany ======== Além dos fotógrafos e publicações citadas acima, o autor gostaria de expressar seu agradecimento a
Paulo Pacini e Helio Ribeiro, do Rio de Janeiro, pela ajuda na preparação destas páginas. ======== Se você tem comentários, críticas ou sugestões, |